sexta-feira, 29 de setembro de 2017

2 POEMAS de Ângelo Rodrigues






















BELEZA VELHA
Precisamos de deslumbramentos,
de estéticas novas,
de ideologias lavadas
e de crenças fortes
para se dar
o que não se possui.
Para se dar a Revolução Beleza!

Começaremos por procurar
nos caixotes do lixo da História
e acabaremos
nos televisivos programas das manhãs.

E, cheios de útil-desespero
e alguma angústia,
queimaremos,
com fogo-novo,
A Beleza velha e falsa
que nos assola.

Contudo,
Viva a Beleza que ainda se conhece!




HORIZONTES
Olhar o céu que dizem ser azul e
perder os pensamentos ofuscados
pela melancolia no horizonte incerto.
Eis o exercício de terapia deste dia!
Descobrir neste exorcismo da manhã,
as inarráveis peripécias da Morte e da Verdade,
que sabemos serem a mesma coisa.
É também o desafio ontológico
de um qualquer deus brincalhão e desocupado.
Hoje estamos cansados da iconoclastia deste Mundo!
Desejamos Música, Arte, Criatividade e Genialidade.
Desejamos abraçar o próprio Desejo e
todas as provocações deste Mundo.
E que vontade temos de liderar a grande revolução
que todos os dias intuímos mas que tarda!
Sabemos muito pouco de profecias
e de espíritos demasiado exaltados,
Contudo,
queremos com muita determinação e vontade
que a Alma beba
do bom vinho idiossincrático
feito das nobres castas da Loucura e da Criatividade.
Por agora, queremos que a Razão se lixe!
 

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

PIPA PIPO PITA APITO PIA PRATO PARTO - Arthur Santos























dizes que tens uma pipa
será que podes nela apipar?
e guardas nela o vinho
ou pões a pipa a voar?
e se tivesses um pipo?
será que podias apipor?
ou esvaziavas o ar?

podias apitar
com uma pita?
ou seria melhor
ter um apito?
nesse caso não seria apitor?
e se o pito fosse... um amor?

até porque temos
cinco gémeas da galinha
que andam na linha
a pata, a peta, a pita, a pota
e.... nesta labuta...
fechamos aqui a porta!

numa pia
pode-se piar
água suja deitar
mas essa pia não é igual
à pia Baptismal!

e numa pira
dá para um fogo atear
mas dará para... pirar?

e no prato
o leite do gato
que se põe na prateleira
e o parto desta vida?
será que se põe na parteleira?
e é bebé ou é uma partida?

pipa pipo pita apito pia prato parto
será uma utopia?

o que vai para aí...
o melhor é pirar-me daqui!

Arthur Santos 2016

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

POUCO PASSAVA DAS OITO HORAS DA MANHÃ Odete Santos Silva
























Pouco passava das oito horas da manhã, o transito para a Ponte estava caótico, carros dum lado, carros do outro, carros no meio.

Esperei calmamente a minha vez para conseguir entrar na fila. Junto duma passadeira para peões, parei civilizadamente e deixei um espaço para alguém que quisesse atravessar a rua.

Eis senão quando um carro vindo de lá detrás me ultrapassa e se posiciona à minha frente em cima da passadeira.

Como o transito estava parado, saí do meu carro e dirigi-me ao carro da frente 
– o senhor já viu o que fez? Ultrapassou toda a gente e não satisfeito estaciona em cima da passadeira

Sem esperar resposta voltei para o meu carro. 

Acto imediato o jovem saiu do carro dele, chegou junto de mim a pedir-me para baixar o vidro da janela e em seguida disse-me com ar simpático 

– Desculpe vóvó, desculpe, juro que não me apercebi. Olhei para ele e disse-lhe com ar mais ou menos sisudo
- oiça, você hoje já me estragou o dia duas vezes! 
- Duas vezes, como assim? 
- Olhe, primeiro, ultrapassou-me e agora está a chamar-me de vóvó!

Ele levou as mãos à cabeça e exclamou 

- óh Vóvó eu sou um desastrado, sou mesmo um desastrado, um desastrado... 

entretanto a fila andou e eu ria divertida. Claro que gosto de ser vovó.








O MAIS VELHO DA ALDEIA
É o mais velho da aldeia. Diz ter mais de 100 anos, não sabe ao certo quantos, mas são mais de 100 com toda a certeza. Vivos, tem 11 filhos, 35 netos, mas foram mais...
Um dia juntou-os a todos para lhes contar uma história. A história da sua vida. Até então nunca lhes tinha dito nada.

Sentado, numa mesa ao nosso lado, um homem de idade avançada, almoçava um cozido à portuguesa, acompanhado de um bom jarro de vinho tinto.

Nós, estávamos ali para  para fazer o mesmo. Comer um cozido à portuguesa. Falávamos animadamente de tudo um pouco enquanto esperámos  ser servidos, quando a voz do nosso vizinho se fez ouvir: os senhores são de Lisboa? Nem precisam dizer que bem se vê. Somos sim, respondemos, mas adoptamos uma aldeia aqui perto - sem querer ser indiscreto, onde é? Lá dissemos onde era a nossa aldeia, -  fizeram mal, vinham para aqui, esta é a melhor aldeia das redondezas e depois, estou cá eu. Roídos de curiosidade, indecisos entre comer o excelente e bem servido cozido à portuguesa que já estava à nossa frente e ouvirmos a história do nosso vizinho que entretanto queria que bebêssemos um copo do seu vinho. Recusámos com um – obrigada, vamos fazer o mesmo. Ele insistiu, - vamos brindar com o meu vinho para ter a certeza que os senhores voltam. E foi assim que, depois de brindarmos, ficámos a saber a sua história:

- Até aos 19 anos vivi na casa dumas senhoras, gente de bem, gente abastada. Duas senhoras, solteironas, já nem lhes lembro o nome. Nunca soube se tinham família. Nunca por lá vi ninguém. Durante muitos anos pensei que era parente delas, sabia que havia qualquer coisa estranha no meu nascimento, mas nunca me interessei em saber. Um dia elas disseram-me que me tinham ido buscar à roda - os senhores não sabem o que era a roda? Claro que não sabem, vêm da cidade, ( por acaso até sabia).

A roda, era a roda dos enjeitados, onde as senhoras da alta sociedade iam largar os filhos em segredo para se limparem da vergonha e da desonra e assim ficarem de “consciência tranquila” por saberem que seriam cuidados e, até quem sabe, adoptados. Disse-lhe. Ele continuou , quase sem me ligar .... pois eu fui libertado da roda por aquelas duas senhoras que me disseram que eu trazia ao pescoço um papel com várias coisas escritas que os ratos roeram. Só escapou mesmo, o meu nome, Francisco Paulo, que se vos apresenta.
É assim que eu Francisco Paulo chego aos 19 anos.

Aprendi a sentar-me a uma mesa, a comer de faca e garfo, a usar um guardanapo, olhe que ao pé de mim ninguém limpava a boca com as costas da mão, o que é que julga? Aprendi a ler e a escrever, a fazer contas, aqui nas redondezas, quando cheguei, só eu sabia ler, escrever e contar dinheiro....
- E então não me pergunta como é que aqui vim parar?
- Pois ia agora mesmo fazer-lhe essa pergunta. Como foi?
Então, chego aos 19 anos e as duas senhoras, olhe que eu julgava que elas eram a minha família, também nunca mais mais olhei para trás, nunca mais as vi,  nem queria, diga-seem verdade. Mandaram-me sentar na sala, deram-me uma sacola com umas coisitas lá dentro e disseram: Francisco Paulo tens quase 20 anos vais ter que deixar esta casa e ir à tua vida.
Tens que te fazer à vida que já és um homem feito. Aqui dentro deste saco tens um dinheirito para os primeiros dias e alguma roupa. E assim me vi na rua. Agarrei-me ao que foi aparecendo até chegar a esta aldeia. Gostei disto aqui. Fiz de tudo. Trabalhei muito até conseguir ser marceneiro cursado. E fui e dos bons. Trabalhei em muitas obras e numa delas encontrei uma garota que dava serventia, ladina, airosa não obstante a dureza do trabalho, desembaraçada e esperta. Reparei logo nela. A menina Rosalina, despertou-me para a vida.

Passei a seguir o trabalho dela e sempre que podia uma conversita mais aconchegada. Talvez até exagerasse na serventia que ela me dava. Tive que inventar muitos pretextos para que ela confiasse em mim. Sempre no maior respeito, ela a tratar-me por senhor Paulo e eu por menina Rosalina.

Um dia, vencendo o embaraço, perguntei-lhe, sem grande convicção, se queria casar comigo e ela disse, sim senhor Paulo, pois até quero. Os preparativos para a nossa vida comum foram muito simples. À excepção da vontade não tínhamos mais nada. Assim juntámos os poucos trapitos de ambos. Uma alma generosa ofereceu-nos, em jeito de prenda, um cobertor para nos abrigarmos do frio.

Reparando que o nosso cozido perdia a graça e arrefecia, atalhou, vou-lhes só contar como foi a nossa primeira noite e depois, comam, comam que este é o melhor cozido aqui das redondezas - pois então, estávamos no mês de Dezembro.

Muito frio que por aqui quando faz frio, é frio mesmo, não são lá as aragens de Lisboa. Fomo-nos deitar e cada um se chegou mais para a ponta do colchão, no chão, ao mesmo tempo que tentávamos que o cobertor, um pouco curto e estreito para dois corpos, nos resguardasse do frio. Fomo-nos chegando, um pouco mais, mas não o suficiente para nos resguardar do frio até que, lá pela madrugada, ela me disse:
- ó senhor Paulo, morro de frio, parece-me que temos que entrar em mais intimidades. Pois sim menina Rosalina eu chego-me mais para junto de si .... deu uma gargalhada sonora, e acrescentou em jeito de ponto final - e foi assim.

 Ela já partiu e eu ainda fico por cá mais uns tempinhos, mas sei que lá em cima alguém me espera. Do cozido à portuguesa nem falo, vamos lá para a próxima semana.


PROCURA-SE GENTE COM CORAÇÃO - Arthur Santos
















(Após ler uma frase da Isabel Santos)

Procura-se gente com coração!
não, não...
não é esse coração
que me convém
esse toda a gente tem.

procura-se gente com outros corações...
aqueles que estão ligados às emoções
todos os dias
sem recurso a tecnologias!

aqueles que falam verdade
e que cultivam a amizade!

aqueles que não sabem ser cruéis
e são fieis.

aqueles que sabem o valor
do amor.

aqueles que são apaixonantes
e que... não admitem transplantes.

sim é desses corações que se procura.
faz falta mais ternura.

atenção, atenção...
procura-se gente com coração!

©ArturSantos2017

GENERALIZAÇŌES ABUSIVAS - Arthur Santos




 














Mariana Mortágua: “Portugal é xenófobo e racista, embora goste de viver na ilusão e na narrativa de que não o é”

o que se percebe
é que sejam de esquerda ou de direita,
naquilo que é fundamental
estão quase todos muito mal,
são quase todos a mesma seita,
pensam igual!

e não é só nesta questão
que confundem a árvore com a floresta.

somos mais de dez milhōes,
mas esta mulher faz confusōes.
não há quem resista
a tamanha ignominia.
para ela é tudo xenófobo e racista.
todos menos ela claro
e é aqui que eu disparo
sem nenhuma pena dela:

menina, vai para a cesta
do mastro mais alto da caravela!

ArturSantos2017







NOTA
Segundo a Academia Portuguesa de Letras, caralho é a palavra com que se denominava a pequena cesta que se encontrava no alto dos mastros das caravelas, de onde os vigias perscrutavam o horizonte em busca de sinais de terra.
O caralho, dada a sua situação numa área de muita instabilidade (no alto do mastro) era onde se manifestava com maior intensidade o rolamento ou movimento lateral de um barco.
Também era considerado um lugar de castigo para aqueles marinheiros que cometiam alguma infracção a bordo.
O castigado era enviado para cumprir horas e até dias inteiros no caralho e quando descia ficava tão enjoado que se mantinha tranquilo por um bom par de dias. Daí surgiu a expressão:
-Vai pró caralho!



terça-feira, 26 de setembro de 2017

A TÉCNICA DO MARMELO - Arthur Santos
















Descrição da técnica de descascar marmelos, inventada pelo meu amigo Nuno Santos Silva

Meus amigos,
conhecem a técnica do marmelo?
aquela que não precisa de martelo?
que mete qualquer técnica num chinelo?
que não precisa nem de cutelo?
não?

e a técnica do berbequim?
aquela do barulho e do chinfrim?
que se pode usar na cozinha ou no jardim?
que torna fácil uma tarefa ruim?
não?

então é assim:
pegue-se um berbequim
com uma broca assim assim.

pegue-se o tal fruto amarelo
parecido com um novelo.

pegue-se uma daquelas ferramentas baratas
que serve para descascar batatas,

espete-se na broca o marmelo
que irá assim servir de modelo
e ficar depois desta operação muito mais belo.

encoste-se nele o descascador
e com determinação ligue-se o interruptor
do berbequim para começar o festim
e é ver as cascas saltarem do marmelo
como salta no barbeiro o cabelo.

é assim,
com descascador, broca e berbequim
que se descasca sem dor um marmelo.

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

OLHA... Mariete Lisboa Guerra




 



















 Poderei escrever "milhões" , mas este é o MEU POEMA
 Mariete (escrito aos 8 anos)


Olha...
Hoje nasci
Do ovo
De novo
E parti
Para conquistar
Para vencer
Para amar
Olha...
Hoje vivi
Não vi sol
Não vi flores
Não vi cores
Só te vi
Olha...
Hoje morri
Tentei amar
Tentei viver
Mas não consegui
Joguei
E perdi
Por ti
Olha...
Se podes ainda ver
Se podes ainda criar
Faz-me de novo
Do ovo
E reza
Pelo que vem
Para que eu
Possa dizer
A bonita palavra
MÃE!

A DANÇA Ana Freitas

























quero entrar nessa dança e contigo bailar

sentir.te na sensualidade do tango
como se em Buenos Aires te revisitasse
percorrer-te numa valsa nos jardins de Schönbrun
Viena seria então a nossa cidade e o Danúbio espelharia azul
deter-te na espontaneidade e volúpia duma chula ou dum forró
até que a música cedesse de cansaço
ao som do acordeão atrevermo-nos num corridinho
rodopiarmos no vira
e perdermo-nos no encontro das voltas

se eu fosse bailarina
serias o meu par e a nossa leveza
fusão

2 POEMAS de Rosário Serrado Freitas























DIÁSPORA
Por mar, por terra
nas asas do vento
milhares abandonaram a terra amada
quais bandos de aves
em migração forçada
segurança e paz procurando
coração ferido pela partida indesejada
aportaram em destinos
nunca apetecidos.
Lágrimas contidas
num esgar que se queria sorriso
para os mais jovens sossegar
abraços sentidos
revelam a saudade entranhada
o medo do futuro
a necessidade do recomeço
a promessa dum breve regresso
aos poucos se desvanece…
neste chão a Norte
a pátria foi e é
a língua portuguesa.




A POESIA É PAIXÃO
A poesia é paixão
é amor verdadeiro
o bater do coração
o sentimento por inteiro
Quem ama a poesia
vive um mundo diferente
cada momento aprecia
com o corpo e a mente
Atento e desperto
aos desvarios da humanidade
aprecia na natureza
toda a sua simplicidade.
 

A MAGIA DA LUA Alzira Carrilho

































MANIFESTO ANTI LEITURA José Fanha






















ABAIXO A LEITURA, PIM!
ANDAM POR AÍ ELEMENTOS SUSPEITOS QUE SE ESCONDEM NAS SOMBRAS DAS BIBLIOTECAS E CHEGAM A IR AS ESCOLAS PARA ESPALHAR UM VÍCIO TERRÍVEL E ABOMINÁVEL ESPECIALMENTE JUNTO DOS MAIS NOVOS! DOS MAIS TENROS! DOS MAIS INGÉNUOS! UM VÍCIO QUE SE CHAMA

LEITURA!
OS PASSADORES DESSA DROGA DURA, OS DEALERS DA LEITURA TRANSFORMAM SIMPLES CIDADÃOS EM LEITORES! EM MORTOS VIVOS! EM GENTE QUE ENTREGA A SUA VIDA AOS LIVROS, ÀS HISTÓRIAS, AOS ROMANCES, AOS POEMAS, GENTE QUE SE ESQUECE DE TUDO O MAIS!

ABAIXO A LEITURA, PIM!
ABAIXO OS LEITORES, PUM!

O LEITOR É UM DOENTE!
O LEITOR É UM VICIADO!
O LEITOR SE ESQUECE DE TUDO MAIS SÓ PARA LER!
CUIDADO COM ELES! PORQUE O PIOR DE TUDO É QUE A LEITURA PEGA-SE! CUIDADO COM OS LEITORES! AFASTAI-OS DE VÓS! PROTEGEI VOSSOS FILHOS!

MORRA A LEITURA, MORRA! PIM!

UMA GERAÇÃO QUE LÊ É UMA GERAÇÃO QUE PENSA!
UMA GERAÇÃO QUE LÊ É UMA GERAÇÃO QUE DUVIDA!
UMA GERAÇÃO QUE LÊ É UMA GERAÇÃO QUE QUESTIONA!
UMA GERAÇÃO QUE LÊ É UMA GERAÇÃO QUE CRITICA!
UMA GERAÇÃO QUE PENSA E DUVIDA E QUESTIONA E CRITICA NÃO ENGOLE QUALQUER PATRANHA QUE LHE QUEIRAM ENFIAR! NÃO OBEDECE! NÃO SE BAIXA! NÃO SE CALA! UMA GERAÇÃO QUE LÊ E PENSA É UM PERIGO PARA A CIVILIZAÇÃO OCIDENTAL E PARA O PAÍS!

ABAIXO OS LEITORES!
MORRA A LITERATURA! MORRA! PUM!

ESTA GENTINHA PÕE-SE A LER EM VEZ DE TRABALHAR, DE VERTER O SEU SUOR A BEM DA NAÇÃO, DE ACEITAR PACIENTE E RESPONSAVELMENTE QUE LHE RETIREM A ASSISTÊNCIA MÉDICA, O SUBSÍDIO DE DOENÇA, A REFORMA, O TEATRO, A MÚSICA! AS CUECAS, SE NECESSÁRIO FOR!
ESTA GENTINHA QUE LÊ PERDE-SE A INTERROGAR AS MEDIDAS NECESSÁRIAS E URGENTES PARA O BEM DO MERCADO, DOS BANCOS, DOS ACIONISTAS QUE SÃO QUEM FAZ ANDAR O PAÍS!
QUEM LÊ AINDA POR CIMA DIVERTE-SE! ENTRETÉM-SE!
A LER, OS LEITORES VIAJAM! E APRENDEM! E REFLETEM! E RIEM! CHORAM! E SONHAM!

MORRA A LEITURA, PIM! PAM! PUM!

A LEITURA FAZ CONHECER PERSONAGENS IMORAIS COMO O DÉBIL CARLOS DA MAIA E A
DESAVERGONHADA EDUARDA DA MAIA, SUA IRMÃ, E BRUXAS REPELENTES COMO A DAMA DE PÉ DE CABRA DO ALEXANDRE HERCULANO OU A BLIMUNDA DO “MEMORIAL DO CONVENTO”.
SERES INÚTEIS E IRREAIS COMO O GATO ZORBAS DA “GAIVOTA E DO GATO QUE A ENSINOU A VOAR”.
CRIATURAS ATREVIDAS, DESOBEDIENTES E REVOLUCIONÁRIAS COMO O JOÃO-SEM-MEDO, O PINÓQUIO, O TOM SAWYER, O OLIVER TWIST!

E LOUCOS COMO O CIGANO MELQUÍADES E O CORONEL BUENDÍA DOS “CEM ANOS DE SOLIDÃO”.

A LEITURA FAZ-NOS VIAJAR POR LUGARES MAL FREQUENTADOS COMO A ILHA DO TESOURO, O BECO DAS SARDINHEIRAS DO MÁRIO DE CARVALHO, OS MARES DO “MOBBY DICK”, A BUENOS AIRES DE BORGES, A PARIS DE MARCEL PROUST, A LONDRES DE OSCAR WILDE, A MOSCOVO DE TOLSTOI!

A LEITURA FAZ-NOS RIR DE PESSOAS SÉRIAS COMO O CONDE DE ABRANHOS, O SANCHO PANÇA OU O ESCRITURÁRIO BARTHLEBY.

JÁ PARA NÃO FALAR DOS AUTORES, MEU DEUS! ESSES SERES ABJETOS! OS ESCRITORES QUE ESCREVEM LIVROS E LIVROS SEM UM PINGO DE VERGONHA! DEVIAM SER PRESOS! ENCERRADOS NUM JARDIM ZOOLÓGICO! CONDENADOS AOS TRABALHOS FORÇADOS! À MORTE! À CADEIRA ELÉTRICA!

CAMÕES, POR EXEMPLO, ERA UM MARGINAL QUE ANDAVA SEMPRE À ESPADEIRADA. E SE FOSSE SÓ ISSO, AINDA PODÍAMOS PERDOAR. A LUTA, A PANCADARIA, A GUERRA NÃO SÃO REPROVÁVEIS. PODEM ATÉ TER UMA FUNÇÃO MUITO POSITIVA NA NOSSA SOCIEDADE!

MAS ESSE TAL CAMÕES ESCREVIA ENTRE ESPADEIRADAS!!! ESCREVIA ESTROFES E MAIS ESTROFES! SONETOS QUE ENCHEM LIVROS E QUE CONTINUAM A GASTAR PAPEL QUE PODIA SER POUPADO PARA FAZER PACOTES DE CASTANHAS OU RELATÓRIOS ANUAIS DA ADMINISTRAÇÃO DAS EMPRESAS.

E O BOCAGE? DIZIA IMPROPÉRIOS! PALAVRÕES! E ATÉ NA POESIA DEIXAVA A MARCA DA SUA POUCA VERGONHA! SE ESCREVESSE PORNOGRAFIA NÓS ACEITÁVAMOS ESSES PALAVRÕES! TINHAM UMA FUNÇÃO SOCIAL! MAS POESIA…!

E NÃO ESQUEÇAMOS ESSA HISTÉRICA E LOUCA FLORBELA ESPANCA, ESSA DESAVERGONHADA, ESSA GRANDE DOIDA, QUE QUERIA AMAR! DEIXAI-NOS RIR! SE AMASSE O SEU MARIDO UMA VEZ POR SEMANA CUMPRIA A SUA OBRIGAÇÃO! SE FOSSE AMANTE DO CHEFE LÁ DO ESCRITÓRIO, ESTAVA A CONTRIBUIR PARA UMA GESTÃO EQUILIBRADA DO PRODUTO INTERNO BRUTO! MAS NÃO! ELA VERTIA NOS VERSOS O SEU DESEJO DE AMAR ESTE, AQUELE, E MAIS O OUTRO!

E LEMBREMOS ÁLVARO DE CAMPOS QUE É UMA INVENÇÃO TORPE, UM SUJEITO QUE NUNCA EXISTIU DE FATO! PURO DELÍRIO! PERSONAGEM FRÁGIL E CONTRADITÓRIA! E RICARDO REIS QUE TAMBÉM NÃO EXISTIA! NEM ALBERTO CAEIRO! NEM BERNARDO SOARES!

TUDO OBRA DO DELÍRIO DO SR. FERNANDO PESSOA QUE ESCREVIA CARTAS DE AMOR DEVIA TER TIDO VERGONHA E DEDICAR-SE À SUA PROFISSÃO POBRE MAS HONRADA DE ESCRITURÁRIO! E DE MUITOS MAIS ESCRITORES PODERÍAMOS FALAR! GENTE HORRÍVEL, QUE SÓ GOSTA DE MEXER NA MISÉRIA E NA LAMA, GENTE CARREGADA DE MALDADE QUE NOS FALA DA QUEDA DOS ANJOS E DE AMORES DE PERDIÇÃO, DE BARRANCOS DE CEGOS, DE LOBOS QUE UIVAM, DE VERSÍCULOS SATÂNICOS!

E ATÉ QUANDO ESCREVEM SOBRE GENTE FELIZ, TEM DE SER GENTE FELIZ COM LÁGRIMAS!

E HÁ QUEM OS LEIA! QUEM SOFRA COM ELES!

QUEM TOQUE CARINHOSAMENTE NOS SEUS LIVROS SEM SABER QUE O VENENO ENTRA PELOS OLHOS QUE LÊEM E PELOS DEDOS QUE FOLHEIAM! E DEPOIS DA LEITURA DE UMA PÁGINA, POR VEZES DEPOIS DA LEITURA DE UM SÓ PARÁGRAFO JÁ NÃO HÁ REMÉDIO! ELES JÁ SÃO LEITORES! ESTÃO APANHADOS IRREMEDIAVELMENTE PELO CANTO DE SEREIA DA LEITURA! A POSSIBILIDADE DE SALVAÇÃO É EXTREMAMENTE DIMINUTA!

OS LIVROS DEVIAM SER RECICLADOS E TRANSFORMADOS EM LENÇOS DE PAPEL! EM SOLAS DE SAPATOS! EM BOLAS DE FUTEBOL! LIVRAI-VOS DE OS LER! OU MELHOR! QUEIMEM-NOS! LEMBREM-SE DAQUELES QUE AO LONGO DA HISTÓRIA TENTARAM SALVAR-NOS QUEIMANDO PILHAS E PILHAS DE LIVROS!

DIGAMOS COM ELES, ABAIXO OS LIVROS!

MORRA A LEITURA! MORRA, PIM!

OS LIVROS FAZEM-NOS AFASTAR DA REALIDADE, DA ECONOMIA! DO MERCADO! DO FUTURO!
UMA PONTE É FEITA COM FERRO E CIMENTO E NÃO COM LIVROS!
NO TRIBUNAL, O ADVOGADO NÃO DEFENDE UM CRIMINOSO COM POESIA!

NA SALA DE OPERAÇÕES O CIRURGIÃO NÃO ABRE OS ÓRGÃOS DE UM DOENTE COM UM ROMANCE!

NINGUÉM SE DEIXA CORROMPER POR UM SONETO!

ABAIXO A PROSA! ABAIXO A POESIA! ABAIXO O ENSAIO!

MORRA A LEITURA, MORRA! PIM!

E TEMOS DE FALAR DAS BIBLIOTECAS, ESSAS CASAS SOMBRIAS ONDE O VÍCIO É PERMITIDO! PAIS! PROTEGEI OS VOSSOS FILHOS! AS BIBLIOTECAS SÃO AUTÊNTICAS SALAS DE CHUTO DE PORTA ABERTA AO PÚBLICO! E ESTÃO CARREGADAS E ALTO ABAIXO DE LIVROS! E OS LIVROS ESTÃO À VISTA! PIOR AINDA, OS LIVROS ESTÃO À MÃO DE QUALQUER CRIANÇA INGÉNUA! E ALGUNS ATÉ TÊM ILUSTRAÇÕES, BONECOS QUE TORNAM A LEITURA MAIS FÁCIL E A PERDIÇÃO MAIS PRÓXIMA! E O PIOR É QUE PODEM SER REQUISITADOS E LEVADOS PARA A CASA, PARA O SEIO DA FAMÍLIA ONDE VÃO ESPALHAR A SUA AÇÃO DESAGREGADORA E MALFAZEJA!

MORRA A LEITURA! MORRAM AS BIBLIOTECAS! PIM! PAM! PUM!
MAS HÁ ESPERANÇAS PARA O FUTURO!

POR ALGUMA RAZÃO MUITOS DOS NOSSOS MELHORES E MAIS IMPOLUTOS DIRIGENTES SÓ LEEM RESUMOS! OU EXTRATOS DA CONTA BANCÁRIA! QUANTO AO RESTO, NADA! NEM UMA PALAVRA! NEM UMA LINHA!

E QUANDO LHES PERGUNTAM O QUE ANDAM A LER, MUITO PERSPICAZMENTE, ELES INVENTAM TÍTULOS DE LIVROS QUE NÃO EXISTEM PARA LANÇAR O ENGANO E, QUIÇÁ, SALVAR ALGUÉM DOS TERRÍVEIS VÍCIOS DA LEITURA!

SIGAMOS O EXEMPLO QUE MUITOS DOS NOSSOS DIRIGENTES E GERENTES E GESTORES NOS APONTAM! HÁ QUE TER A CORAGEM DE DIZER BEM ALTO:

A LEITURA PREJUDICA GRAVEMENTE A IGNORÂNCIA!

E SEM IGNORÂNCIA O PAÍS NÃO PROGRIDE! NÃO CRESCEM OS JUROS! NÃO SE INVESTE NAS OFF-SHORES! O ESTADO NÃO VENDE EMPRESAS ABAIXO DO PREÇO AOS PARTICULARES! O PREÇO DA GASOLINA NÃO SOBE!

ACABEMOS DE VEZ COM A LEITURA!

ABAIXO A LEITURA! PIM! PAM! PUM!

SE PUSEREM UM LIVRO À VOSSA FRENTE, CAROS AMIGOS, CUIDADO! DESVIEM O OLHAR! NÃO ABRAM NEM UMA PÁGINA! PODE BASTAR UM VERSO PARA CONTAMINAR! UM HOMEM QUE LÊ PODE DESEJAR VIVER NUM MUNDO MELHOR! PODE DE REPENTE SENTIR AS LÁGRIMAS CORREREM-LHE PELA CARA ABAIXO! PODE QUERER SUBITAMENTE AJUDAR OS AFLITOS! PODE ABRAÇAR ESTUPIDAMENTE UM AMIGO OU BEIJAR OS LÁBIOS DE UMA RAPARIGA BELA COMO UM RAIO DE SOL A ILUMINAR A MAIS BELA ROSA DO JARDIM!

POR ISSO É PRECISO FECHAR AS PORTAS AOS ANTROS DE LEITURA! SABEMOS QUE PODE PARECER DOLOROSO MAS É FUNDAMENTAL ARRANCAR DE VEZ OS LIVROS DAS MÃOS DOS VICIADOS E IMPEDI-LOS DE LER UMA LINHA SEQUER! SE FOR PRECISO TAPAI-LHES OS OLHOS! É PRECISO PREPARAR O FUTURO DOS NOSSOS FILHOS! NÃO LHES DAR ILUSÕES, NEM SONHOS, NEM ALEGRIAS! NEM DÚVIDAS, NEM SABEDORIA, NEM NADA!

ABAIXO AS BIBLIOTECAS! ABAIXO OS LIVROS!

MORRA A LEITURA DE UMA VEZ POR TODAS! MORRA! PIM! PAM! PUM!

BALADA DAS ONZE E MEIA Joaquim Pessoa

























Onze e meia: meia hora
para acabar este dia.
Meia hora ainda é hoje.
Meia hora é amanhã.

Às onze e meia da noite
vai haver muita pancada
num bar da rua das Pretas.

Vai haver muita mudança
nos decretos aprovados.

Às Onze e meia da noite
no quarto não se ouve nada
mas no berço uma criança
dorme o sono dos poetas
que andam subalimentados.

Às onze e meia da noite
direi vinte e três e trinta.

Acordo o galo vermelho
com dois murros no pescoço.

Canta, canta, meu pelintra
o dia de hoje é tão velho
que amanhã já estamos mortos.

Às onze e meia da noite
os Ódios nunca estão fartos.

Às onze e meia da noite
a morte anda lá por fora
a pedir contas à vida
e os polícias têm medo
da própria sombra que pisam.

Onze e meia. Está na hora.

No relógio ainda é cedo.

Os ponteiros não deslizam.

Às onze horas e meia
esperamos por amanhã.
Chega a noite para a ceia
com dois pezinhos de lã.

Passam gatunos, canalhas
com seus múltiplos perfis.

Caem corpos e navalhas
no silêncio dos lancis.

Onze e meia. A meia hora
que falta, nunca mais passa.

Não passa. Nunca mais passa.
Eu sei lá quanta desgraça
se apodera em meia hora
das ruelas e dos becos
que apodrecem na cidade!

São onze e meia. É agora
que os olhos verdes dos cegos
pressentem a claridade.

Às onze e meia da noite
o vento não bate à porta
nem quer saber de mais nada.
Às onze e meia da noite
no bar da rua das Pretas
continua a haver pancada.

Às onze e meia da noite
os cães disputam a dente
uma cadela aluada.

Às onze e meia da noite
há travestis no Rossio
à pesca dos marinheiros
que deixaram o navio
e fazem ondas de cio
no sangue dos paneleiros.

Bateram as onze e meia.

Só faltam trinta minutos.

Acende-se a lua cheia
na rua dos Sapateiros.

São onze e meia da noite
e eu quero ficar contigo
entre lençóis de algodão.

Fincar no flanco uma espora.

Cavalgar por meia hora.

Dar rédeas ao coração.

Às onze e meia da noite
é tempo de solidão.

E nas entranhas do medo
fazem-se filhos diversos.
Como um padeiro faz versos
ou um poeta faz pão.

Às onze e meia da noite.

Às onze e meia da noite
recebem-se embaixadores
e à mesma hora os porteiros
afugentam os trapeiros
vestidos de malfeitores.

Às onze e meia da noite
a Primavera passou-se
para o lado do Outono.
E uma Maria qualquer
nas alamedas do sono
cansada de ser mulher
às onze e meia matou-se.

Em ponto. São onze e meia.

Esta noite os redimidos
hão-de fazer por esquecer.

Bem comidos e bebidos
não tardam a adormecer.

E um frasco de comprimidos
na mesa de cabeceira
vai ajudar os sentidos
a cozer a bebedeira.

Às onze e meia da noite.

Às onze e meia da noite
num gabinete privado
(como a irmã cotovia)
o tipo que está ao lado
cantou tudo o que sabia
para subir de ordenado.

Às onze e meia da noite
rastejam cobras na lama
onde afocinham as putas
Senhoras Donas da Cama.
Mas as putas que são putas.
Não as que têm a fama.

São onze e meia da noite.

Já só falta meia hora.

Apenas trinta minutos.

Às onze e meia da noite
ponho a tristeza de lado
e uma gravata de seda.

Quero ouvir cantar o fado.

Quero dar uma facada
no galo da consciência.

Quero menos paciência
e um pouco mais de loucura.

E enquanto são onze e meia
ainda dura a pancada
no bar da rua das pretas
os putos fazem punhetas
em jeito de habilidade
apenas com quatro dedos.
E descobrem os segredos
de nascerem portugueses
filhos de um povo adiado.

Feitos aqui e agora.

Quando falta meia hora
para acabar o passado.

domingo, 24 de setembro de 2017

GOTA D'ÁGUA Carlos Cardoso Luís























A gota que nasce na serra
A outra gota se une
Dão as mãos na descida
Estão preparadas para a vida
Que as vai levar ao cume
O par de gotas logo se multiplica
Geram um fio corrente
Juntam-se formam um charco
Estão maiores certamente
O charco encontra saída
Continua o caminho da vida
Descendo a serra inocente
Vários charcos a descer
Nem sempre paralelamente
Engrossam o correr alegre
Da água outrora gota
Agora á procura do leito
Num redemoinho imperfeito
A ultrapassar obstáculos barreiras
A alimentar árvores e flores
Deixando para trás amores
Num caminhar apressado
Contemplando as margens ao lado
A correr... correr sem parar
Cansada alegre sorridente
A gota multiplicou-se cresceu
Adulta água a descansar
No seu refugio final o mar

A NOITE... Isilda Marques







Chegou por entre os últimos
Raios de sol em bicos de pés
Na ponta do meu nariz
O teu perfume atordoava
Quando me davas beijos..
Sopravas nos ouvidos
As tuas palavras doces
Carícias de mãos pelos cabelos
Os nossos corpos num frenesim
Aninharam- se em sonho mágico
O amor era infinito .
A noite...
Apanhou-nos em voo louco
Abalados de desejo e paixão
Giramos à volta do mundo
Em abraços de prazer divino
Éramos a cor cintilante
O irradiar da loucura.
A noite...
Caiu sobre nós num manto
De mistério e névoa
De luz e penumbra
Eramos estrelas cadentes
No fio das emoções
A vertigem da ilusão.
A noite..
De lua enfeitiçada
escorregamos no buraco
Tão negro da solidão
Desarmamos o momento
Acordamos da ilusão
Efémera noite cravada
Na embriaguez dos sentidos
Que nos juntou caprichosa
A noite...
Separou-nos por entre
os raios de sol da madrugada
Tocou o relógio sem parar
Suspiramos de ausência
Esgotamos o nosso tempo
Numa só e estranha noite.

O BEIJO Mariana Loureiro

























Sentei-me na relva orvalhada pela noite
respirei a liberdade da manhã
num acordar lento e rotineiro…
Estavas ali… respiravas pausadamente
absorvias os aromas inebriantes da primavera em flor...
Tocamos a mesma música
bebemos os sons do nosso olhar
há magia no ar quando as tuas mãos me vestem
de suspiros e gemidos
e eu te sussurro no ouvido palavras embrulhadas em paixão
sabores, afagos, amor
mensagens que os corpos emitem
quando os desejos se abraçam
e dentro de nós brilha um sol luzente
num beijo profundo, doce e ardente.
O beijo sela a nossa união
porque bonita é a flor da nossa paixão!

OUVI AS TUAS GARGALHADAS Manuela Clérigo




 



















Ouvi as tuas gargalhadas
cobertas de sol
e já perto de mim
fizeste-me sentir
uma criança
pediste me
um sorriso
e eu dei te
pediste me
um abraço
e eu dei te
pediste me
a minha mão
e eu dei te
e sem me pedires
eu dei te
o meu amor
com a ternura e a
inocência
de uma criança

BEIJO AUSENTE Paulo Afonso Ramos
























Levito na ânsia do teu beijo!
Percorri as ausências dos espaços
ultrapassei as barreiras da inépcia
e formulei o meu desejo
bordado na acácia
dos meus pensamentos escassos.
Imaginei o momento
que tanto almejo
construído de muito sofrimento
e algum lampejo.
Sonho que se repete constantemente
que domina a minha mente
e acalentado me vejo.
Oh! Híbrido estar…
Oh! Imagem que se confunde
e me dá asas e me faz voar.
Levito na ânsia do teu beijo!
Espreito o caminho
que percorro sozinho.

SINAIS DOS TEMPOS Margarida Cimbolini

























Dias inquietos
noites de tempestade.
Por dentro um tremor surdo.
Gestos cortados à nascença .
Valerá a pena ??
A natureza inteira surge tranquila.
Espera...
Aparenta um gigante descansando .
Também ela se revolta calamitosa.....
O mundo ruge e grita sem bonança .......
Os Países degladiam-se... desequilíbrio ...
...maldade........ inveja...miséria ......
.e fortes riquezas...
Há menos crianças...que mal sabem brincar..
Os valores vacilam.
As famílias desfazem -se.
Na sede de poder o amor murcha.
As religiões proliferam....
Choram as almas...confusas se tornam as horas ..
Os dados estão lançados....
O pano verde ha-de desfazer-se...
O céu ficará murcho...
A lua o Sol tudo rodará sem limites...
Humanidade acorda ! e corre ...corre muito....
se olhares pra trás verás o futuro mil vezes pior...
Os dias andam inquietos !

É URGENTE Margarida Vieira

























é urgente aquietar o infinito da terra quente
premente de lava laranja de fogo
e chispas de luz
que se ausentam como o vento norte
sempre que nos fustiga o rosto docemente
é urgente assumir as contradições de um tempo
que fervilha como champagne
derramado sobre taças de um cristal falante
pelas salinas do entontecimento
é urgente espalhar pétalas pelo corpo da deusa
pois todos os dias são dias sem véspera
para que o amor e a humanidade
se acasalem para sempre

PEIDO SEM FILTROS Carlos Mendes























Peido sem filtros
O peido do Sobral
foi magistral
Mesmo estando presente
O Sr Presidente
Não evitou
Que toda a gente
Gritasse
“viva o peido do Sobral”
A um peido embora fraco
Mas magistral
Único
Como o Sobral

Com mais peido
ou menos peido
Tudo correu pelo melhor
Não fosse aquele peidinho
Que largou o Salvador
Naquele momento exacto
Em que ficou tudo
Estupefacto
Com o peido Magistral
Como só da o Sobral
Naquele palco solidário
De lindas apresentadoras
Quais senhoras doutoras
Diziam umas para as outras
“Este peido do Sobral
Foi de facto genial ”
Para acabar esta história
Estou de acordo com o
Sobral
Caguem pr’ aí avontade
E que
Viva Portugal

PODE SER Pedro Branco

























Pode ser que os dias sejam apenas ilusões
Pode ser que cada sonho se limite ao sumo das canções
Pode ser que um poema consiga abrir o mar
Pode ser que cada segundo seja magia no amar...

Pode ser que a vida tenha paz
Em tudo o que faço e sou capaz
Pode ser que grite um sussurro em ti
Só para te dizer que estou aqui...

Pode ser que a alma se distraia demais
Pode ser que a partida se faça ao sabor do cais
Pode ser que o meu corpo não aguente
Pode ser que o passado ainda se veja lá à frente...

Pode ser tudo, pode ser nada
Cada mistério, uma nova estrada
O suor da ternura abençoada
Que se faz ao mundo, que se faz à estrada...
Pode ser..

HOJE QUERO FALAR DAQUELE TEMPO... Fernanda Lopes























Hoje quero falar daquele tempo,
dos meus pensamentos,
da confusão que tudo me fazia
e ninguém me respondia.

Um dia escutei alguém
que falava e percebi tudo.

Descobri que mais e melhor entenderia
quando soubesse ler e escrever.
Mas a escola ainda estava tão longe do meu horizonte.
Tudo o que eu sabia
era andar, correr, cantar, brincar
e até sabia falar com grande desembaraço,
não esquecendo que também era perita
a medir a força do braço
e ganhava sempre ao meu avô.

mais tarde vim a descobrir
que era ele que fingia não ter força
e a desistir maravilhosamente
para me ver saltar de contente.

Era um encanto o meu avô.
Um homem de semblante terno,
trato cordial e fraterno,
Carpinteiro de profissão.

tinha como alcunha “o Manhoso”,
não por ser matreiro ou vaidoso,
não, o meu avô era esperto
e não poucas vezes
era procurado por “ letrados”
para resolver problemas
de conhecimento técnico.

Na verdade o meu avô
era um habilidoso,
“engenhocas”. como se dizia.

Outros ainda,
atreviam-se a reconhecer nele um curioso,
uma alma contemplada com um dom.

A este propósito
era frequente depois de jantar
ouvi-lo comentar algumas dessas visitas
que apelidava de “santas ignorâncias”.


ou então,
quando se tratava de resolver questões de trabalho,
dizia simplesmente “
- e foram estas criaturas à escola”

A minha avó Piedade,
mulher austera por feitio e não defeito,
raramente esboçava
uma expressão de compreensão
com os petizes como eu.

Tudo o que fazíamos
era motivo de uma vontade indisfarçável
de um qualquer castigo
ao que o meu avô contrapunha dizendo
- ó mulher, deixa os meninos,
são tão pequenos ainda,
só querem brincar,
têm muito tempo para ser adultos.

Fria com o meu avô,
nunca consegui assistir a um beijo
mesmo que furtivo,
nem mesmo espreitando
ou ficando à escuta
quando se retiravam para o quarto.

Um dia depois de jantar
aproveitando a presença dos dois por perto
perguntei à minha mãe bem alto
mas esperando a reacção
ou resposta de qualquer um
que satisfizesse a minha inocente curiosidade:

- os avós não dão beijos?
Riu-se a minha mãe.

A minha avó repreendeu-me dizendo
- isso lá são conversas de criança?

Só o meu avô
ficou à espera do beijo que pediu
e que eu nunca tive a alegria de testemunhar.

Mas não passou muito tempo,
assisti com tristeza às lágrimas
que vi cair no rosto da minha avó
e tive a certeza
que elas eram também lembranças
de beijos trocados
e um deles seria
o da minha inocente pergunta
naquela noite depois de jantar:
- Os avós não dão beijos?